domingo, 3 de outubro de 2010

Cândido dos Reis, o Romeu da República Portuguêsa

Estamos no Outono, estação dos climas temperados e sem significado para o sistema climático cabo-verdiano. No entanto, quando criança (em plena era colonial) estudávamos as quatro estações do ano, como se fosse essa a nossa realidade. As folhas caídas e amareladas das árvores, eram para nós, fruto da imaginação. As únicas "coisas amarelas" de que me lembro caírem das árvores, eram umas vagens secas de uma espécie arbórea existente na Rua Cândido dos Reis e com as quais a criançada se deleitava a fazer "ventoinhas" cruzando duas dessas vagens sobre a extremidade de um pau de carriço e fixando-as com um pequeno prego, tendo filtros de cigarros como anilhas amortecedoras.

A Rua Cândido dos Reis da cidade da Praia traz-me sempre boas recordações de infância. As citadas árvores, quando floridas, emanavam um aroma tão suave e perfumado, que me faziam, então, insistir com meus pais a passar sistematicamente por esta rua, quando passeávamos de carro pela cidade. Nessa ocasião o passeio era curto pois poucas ruas tinha a Praia. Minha mãe, de quem herdei a mania dos purismos e das precisões, esclarecia sempre que passávamos pela rua paralela à Cândido dos Reis, a "Rua d' Horta", que esta não se chamava assim, mas sim Miguel Bombarda! e acrescentava logo que a Cândido dos Reis era também "Almirante Reis" e não Cândido dos Reis. 

Estas duas ruas gémeas (não idênticas porém) vão ambas desembocar na rua da "Igreja Protestante", a dos Nazarenos, naquela ocasião denominada Rua 5 de Outubro, da qual descia também a Rua da República. Parece que a toponímia de então, insistia  no ideal republicano. Os ilustres homenageados, foram os principais promotores do movimento que se iniciava há 100 anos, a 3 de Outubro de 1910 e que conduzia à proclamação da República Portuguesa a 5 de Outubro de 1910. 

Irónicamente, estes dois amigos e companheiros, não assistiram à citada proclamação por que tanto lutaram. O Dr. Bombarda, médico, foi assassinado a 3 de Outubro desse ano, por um doente mental do Hospital de Rilhafoles e Cândido dos Reis, ao saber disso e das notícias de denúncia do golpe, pensou estar tudo perdido e matou-se (a 4 de Outubro). Triste história deste herói de origem cabo-verdiana, que me faz lembrar o final de Romeu e Julieta onde Romeu se mata pensando que Julieta estivesse morta.

A origem cabo-verdiana de Carlos Cândido dos Reis, é descrita pelo conhecido genealogista cabo-verdiano, João Manuel Oliveira, nestes termos:
"A mãe é que era da Brava. Carlos Cândido dos Reis, (sob reservas ), filho de Matilde de Azevedo, mais conhecido por Almirante Reis por causa da avenida lisboeta que leva o seu nome. Embora todos saibam o seu nome poucos sabem quem foi, facto que o escritor Luís de Stau Monteiro põe na boca de um personagem do romance Angústia Para o Jantar, (p. 18): “Quem teria sido o Almirante Reis? Que teria ele descoberto? A pólvora? Se calhar descobriu a pólvora e não disse nada a ninguém”. Nasc. a 16 de Janeiro de 1852, nat. de Lisboa, (segundo outros teria nascido em Cabo Verde, sendo baptizado em Lisboa)."
Ambos foram enterrados no mesmo dia e tiveram um funeral conjunto. Quer um quer outro, eram declarados anticlericais. De notar que ser anticlerical, não significa que se seja agnóstico ou ateu:
"O anticlericalismo propugna pela separação e não interferência entre as esferas do poder religioso e do civil. O activista anticlerical critica a acção política das instituições religiosas."  [tirado daqui]
A propósito de liberdade religiosa e separação da Igreja do Estado, acontece que neste momento, encontro-me em Provo, nos Estados Unidos, a participar no 17º Simpósio Internacional sobre Lei e Religião, a convite da Brigham Young University, universidade ligada à Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias (os Mormons).

Hoje, Domingo, participei na Conferência Anual da citada igreja, evento grandioso realizado em Salt Lake City num auditório de 21 mil lugares e acompanhado pelo celebérrimo Coro do Tabernáculo Mórmon.

Deixo-vos com um vídeo deste coro:

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