domingo, 30 de agosto de 2009

Do vazio de Rutherford à chuva copiosa de Bronson

Quando comecei a dar aulas de Química no ensino superior (ver o artigo: Os meus queridos alunos - I), era para mim um grande desafio fazer passar a noção da estrutura atómica. Era um assunto que me apaixonava, pois meu sonho de adolescência era vir a ser um físico nuclear como Einstein. Ao me formar em Química, a questão da estrutura atómica era como uma ponte entre esta ciência e a física nuclear. Talvez por isso, no percurso da história da estrutura atómica, que ia de Demócrito a Schrödinger, era para mim o ponto mais emocionante, o da demonstração de que "o átomo era vazio". Esta conclusão foi conseguida por Rutherford, (um cientista nascido precisamente há 138 anos, na Nova Zelândia, em 30 de Agosto de 1871, que, embora físico, ganhou em 1908 o prémio Nobel da Química), que interpretou a experiência levada a cabo pelos seus discípulos Geiger e Marsden; vejam:

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Rutherford chegou a essa conclusão [na vida universitária, é mesmo assim: os discípulos fazem o grosso do trabalho e o mestre "tira o coelho da cartola"] e para demonstrar quão vazio era o átomo do hidrogénio, comparou-o a um campo de futebol, onde o minúsculo electrão circulava ao longo das "4 linhas" e o grosso da massa do átomo se encontrava condensado numa bola no centro do campo. Eis ao lado o "Estádio" da Várzea em 1981 como imagem para a comparação.

A ênfase que eu punha na explicação dos raciocínios de Rutherford, valeram-me da parte de meus alunos a sugestão de dar esse nome ao meu então recém-nascido primogénito (Outubro de 1983). Claro que não fui no bote, e coloquei o nome de Marcos Miguel ao pimpolho. Alguns, mais meus amigos, até insistiram, mas disse-lhes que tirassem o cavalinho da chuva.

E nesta época chuvosa, estar à chuva me faz lembrar um filme que me marcou pelo seu suspense e brutidão: "O passageiro da chuva", estreado há 40 anos e contracenando Charles Bronson e Marlène Jobert. O actor era mesmo feio e assustador, mas revelou-se um dos melhores actores para este tipo de papéis. Vejamos então um extracto:


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Hoje, dia internacional dos desaparecidos, fazem seis anos que desapareceu da face da Terra, este grande actor, que foi Charles Bronson !

E agora desapareço eu! (do blog, claro!)
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domingo, 23 de agosto de 2009

De Morais e Castro aos burros do "Tonecas", da Eulália e do Maio

Pois é! Até parece que os meus mais queridos actores cómicos portugueses, teimam em me pregar sustos, indo desta para a melhor! Acabo de chegar de férias, da Ilha do Maio e qual não foi o meu espanto ao sintonizar a SIC notícias e me dar conta do enterro do célebre professor das Lições do Tonecas. É esse mesmo, José Armando Tavares de Morais e Castro:

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Segundo o Jornal Público:
É da televisão que o grande público terá uma imagem mais vívida de José Armando Tavares de Morais e Castro, das séries e novelas da RTP e da TVI às Lições do Tonecas (1996/8), mas foi no teatro que se estreou, ainda no liceu, e que mais trabalhou ao longo de mais de 50 anos de carreira. Dirigente da Casa do Artista, onde residia nos meses que antecederam o seu internamento, casado com a actriz Linda Silva, Morais e Castro nasceu em Lisboa a 30 de Setembro de 1939.
Assim como Solnado, faltavam-lhe poucas semanas para completar uma idade a números redondos: 80 para Solnado, 70 para Morais e Castro. Ambos nos divertiram imenso e não falhava nenhum episódio das Lições de Tonecas. Vejam um extracto de um deles:


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As aulas desta série até me fazem lembrar a escola da Dona Eulália, onde passei bons momentos e episódios do mesmo tipo que os das referidas "Lições do Tonecas". Dona Eulália era uma Setubalense, casada com um funcionário, salvo o erro dos TACV, o Sr. Arlindo. Na escola particular dela, éramos poucos e lembro-me dos terríveis irmãos Pinto Eliseu, das gémeas Ruth e Marilu, do Jorge Manuel (filho da professora), do Nando, do Necas, do Carlinhos, do Jorge Ribeiro, da Tó, e de alguns outros mais. Não eram raras as sandices à moda do Tonecas: uma vez, a professora pediu que falássemos dos tipos de sangue que circulam no corpo humano e uma das gémeas disparou sorridente: "sangue arterial e sangue venenoso!"

Gargalhadas e "burra!" foram as explosões que se sucederam. Dona Eulália fazia um esforço para ela também conter o riso e repreendia os que chamaram a pobre colega, agora chorosa, de "burra". Lá foi ela dizendo que as pessoas não são burras e que este animal até era bastante astuto e alerta.

A propósito de burros astutos e alertas, não posso deixar de manifestar a minha tristeza pela extinção dos burros selvagens da Ilha do Maio. Com efeito, há 16 anos quando lá tinha ido pela última vez, pude ver esses soberbos animais correr sobre as calcárias pedras da ilha e a se esconder entre os arbustos da famigerada Prosopis juliflora. Esses burros eram, segundo os camponeses do Maio, impossíveis de domar; para os ter era necessário capturá-los bebés e criá-los com cuidado. De cor bege, estes animais ostentavam uma listra castanho escura a negra, na base do pescoço. Infelizmente, a seca fê-los morrer de sede ao longo dos anos e hoje já não os há selvagens! Também verifiquei com amargura que o número e a variedade ornitológica diminuiu grandemente. Onde estão as lindas aves do Maio? Porque não houve declaração de "zonas naturais protegidas" para o Maio? Houve sim a designação de ZDTIs (Zonas de Desenvolvimento Turístico Integrado) que muita polémica fez surgir (ver aqui por exemplo) .
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Fiquemos agora com um documentário sobre esta magnífica ilha do Maio, que aos poucos vai despontando para um turismo promissor (ZDTI aqui):


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domingo, 16 de agosto de 2009

Bossa Nova, Sex symbol, Elvis e Caymmi

O Verão bate em pleno! Bem me apetecia refrescar-me em praias tropicais, ao sabor das ondas (do mar e das beldades). Ainda bem que em Cabo Verde temos praias dessas que fazem inveja a Ipanema e a suas garotas!

Uma caipirinha ao som da célebre "Garota de Ipanema" não cairia nada mal! Saibam que esta mundialmente famosa canção de Bossa Nova, foi composta no ano de 1962 (ano da estreia do filme Dr. No - a foto ao lado foi extraída deste clássico de James Bond) e que a 19 de Março de 1963 (dia do 27º aniversário da garota da foto ao lado) sai a gravação para a gravadora Verve.


Claro que esta garota não é de Ipanema! Trata-se de Úrsula Andress, uma das sex symbol dos anos sessenta. Nesse tempo comecei a ir ao cinema em frente da minha casa (ocupava um dos lugares captivos de que meu pai dispunha no cine-teatro municipal, por conta da assistência técnica que prestava ao cine) e deleitava-me com os filmes de James Bond e outros de cariz recreativo, alegre ou musical. Esta actriz tinha seu nome na boca de todos os púberes da época, que em 1968, já a tinham visto em "Casino Royale - 007", "What's New Pussycat?" e "Fun in Acapulco". Eis um pouco deste último, onde contracena com o grande Elvis Presley:

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Mas, que atrevimento esse o de Presley, em martelar nas palavras Bossa Nova, num show de Rock que de Bossa Nova só levava o título: "Bossa Nova Baby"? Que diria Tom Jobim, um dos pais desse ritmo e um dos criadores da Garota de Ipanema?

Antônio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim , mais conhecido como Tom Jobim, é considerado um dos maiores expoentes da música brasileira. Amigo de um outro grande expoente da música brasileira, Dorival Caymmi, ("um compositor e poeta popular que se inspirava nos hábitos, costumes e tradições do povo baiano e que tendo como forte influência a música negra, desenvolveu um estilo pessoal de compor e cantar, demonstrando espontaneidade nos versos, sensualidade e riqueza melódica" - tirado daqui) ei-lo no vídeo a seguir, em casa de Caymmi, interpretando com ele e com a ajuda das respectivas famílias, o não menos célebre "Eu vou para Maracangalha" da autoria de Dorival:

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Que bonito ver neste vídeo, o velho dorival Caymmi rodeado da família e dos amigos ! O homem (embora aqui, quase octogenário) transborda juventude e alegria. Será que poderemos dizer o mesmo da "garota não de Ipanema" que está na fotografia introdutória deste artigo? Vejam-na na foto ao lado, agora com 73 anos.



Este artigo, fi-lo em homenagem a Elvis Presley e a Dorival Caymmi, pois hoje, 16 de Agosto, é o aniversário do desaparecimento físico de ambos: Elvis em 1977 com 42 anos e Dorival em 2008, com 94 anos.

Como o Bossa Nova e a Garota de Ipanema foram o elo entre Elvis e Dorival, através de Andress e Jobim, eis que vos proporciono um derradeiro clip, de Tom Jobim há 20 anos atrás (1989) a tocar Ipanema em estilo Jazz:


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domingo, 9 de agosto de 2009

A Electra levou-me de Gatas à Gamboa

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Mas que fim-de-semana! Sob o signo do 25º Festival da Baía das Gatas (ver aqui) vários acontecimentos marcantes tiveram lugar, sendo o que mais me entristeceu, o do falecimento de Raúl Solnado. Aquando do seu 79º aniversário, tive o prazer de lhe dedicar um artigo, que poderão rever aqui. Após ter ouvido a notícia na RTP-África, mudei de canal para ver em directo o que se passava na Baía das Gatas.


Coloquei a janelinha televisiva no canto superior esquerdo do monitor do PC e comecei a engendrar o artigo que iria escrever neste blog. Apetecia-me falar de Mimetismo e até publiquei no meu recente fotolog, uma fotografia que tirara de um Louva-a-Deus entre as folhas de um feto. Mal se vê o animal (assim como mal se vêem estes, duma coleccão da National Geographic).

De repente, a Electra (famigerada companhia cabo-verdiana de águas e electricidade) resolve cortar a corrente eléctrica do meu bairro, ficando eu às escuras com o rato na mão e metade do meu artigo em águas de bacalhau. Às apalpadelas fui-me deitar.

Mas quem disse que ia poder dormir? Nem eu nem ninguém em casa o pôde fazer. Os mosquitos invadiram nossos quartos e eu fui a principal vítima. Sem electricidade os ventiladores não podiam dissipar o dióxido de carbono nem evaporar o nosso suor. Assim, o dióxido de carbono por nós exalado e o suor não evaporado, foram os principais atractores dos hediondos insectos. Na realidade os mosquitos são atraídos pelo CO2 que expiramos e pelo ácido lácteo de nosso suor (sendo eu o mais volumoso, produzo mais destas substâncias e sou a 1ª escolha desses dípteros). Passei a noite, com uma lanterna na mão esquerda, a dar-lhes palmadas esborrachantes (contra a parede) com a direita, ao mesmo tempo que praguejava e exigia nosso sangue de volta.

E pensar que durante a minha puberdade já fui criador de larvas de mosquito! Tinha vários bocais onde as criava. Até gostava delas. Maluco eu? Não, fazia isso por várias razões, entre as quais a científica. Porém, a principal razão era como alimento vivo para os meus peixinhos de aquário, sobretudo para os Guppys, extraordinários animais ovovivíparos cujos machos eram um regalo para nossos olhos, tais eram as variegadas cores ostentadas pelas barbatanas e caudas.

As fêmeas dos guppys são desprovidas de graça, pois acinzentadas e gordinhas passam despercebidas. Porém, são utilizadas no combate aos mosquitos em águas estagnadas de riachos, lagoas e gamboas (atenção a este nome, já volto a ele). Convido-vos a assistir este clip onde se pode ver fêmeas de guppy a caçar larvas de mosquito:

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E nós na Praia até temos uma gamboazita em frente da central eléctrica (Electra e Mosquitos, os agressores do dia). Segundo os entendidos: "Esta designação, totalmente popular, é o nome dado a um braço de rio de mangue, que não tem nascente e está sempre sob influência da maré. Tanto que na maré baixa uma gamboa pode ficar completamente seca." (tirado daqui). E esta gamboa (ao lado do bar Motcha) deu o nome à praia de mar onde se insere, que se tornou igualmente famosa pelos seu Festival da Gamboa!

Não pude então deixar de associar a Baía das Gatas à Gamboa. Comecei a noite com a música (carnavalesca) das Gatas e terminei com o carnaval dos mosquitos da Gamboa!

Além dos célebres festivais, estas duas praias me trazem outra singular recordação: o desconforto na sola dos pés, ao pousá-los no chão de suas águas. Na da Baía das Gatas, sente-se a áspera sensação dos corais que atapetam o fundo (ver foto ao lado e artigo aqui).

Na Gamboa, sentia-se o manto de Turritelas que magoava quem as pisasse. Nos bons velhos tempos, essas conchas unicórnias se amontoavam aos milhares na parte da praia da Gamboa mais próxima da então Cadeia Civil (onde agora se situa o Hotel Trópico). Eram tantas que acabaram por servir de material de revestimento decorativo na construção civil.

A Turritela, Caramuja em cabo-verdiano, é um gastrópode da família dos Turritellidae que tem a particularidade singular de se alimentar através de um processo de filtragem da água, coisa reservada aos moluscos bivalves e não aos gastrópodes. As turritelas já existiam no Miocénio e são muitas vezes encontradas em fósseis, permitindo alguma datação e informações paleontológicas. Foram encontradas turritelas fósseis em São Nicolau de Cabo Verde (ver aqui)

Como já me tinha referido em artigo anterior (ver aqui), as conchas de Cabo Verde têm sido um achado para os coleccionadores e entendidos. Vários estudos, catalogações e bate-papo têm tido lugar pelo mundo fora e nós aqui no país estamos a leste do paraíso. Vejam ao lado a capa de um interessante livro sobre a malacologia de Cabo Verde. Esta ciência, como também já o referira, foi um dos primeiros interesses científicos de Jean Piaget, que por sinal se comemora hoje o 113º aniversário de seu nascimento: 9 de Agosto de 1896.
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domingo, 2 de agosto de 2009

O povo quem mais ordena, levou Hitler à minha árvore genealógica

Já é hábito olhar para as efemérides, para espevitar as meninges a respeito de algum evento relacionado com a minha vivência. Eis que me deparo com Adolfo Hitler! O facto assinalado hoje é o da chegada do ditador à presidência da Alemanha, pela morte do então presidente Hindenburg. Eis um extracto da notícia, tirado do Wikipédia:
"Em 2 de Agosto de 1934, Hindenburg morre. Hitler apodera-se do seu lugar, fundindo as funções de Presidente e de Chanceler, passando a se auto-intitular de Líder (Führer) da Alemanha e requerendo um juramento de lealdade a cada membro das forças armadas." (ler todo o artigo aqui)
Lembrei-me logo de muitos dos filmes da II Guerra Mundial que assisti. A saudação nazista em muitos deles patente, fez-me recordar de uma foto antiga, da classe de ginástica da minha mãe, aquando de sua passagem pelo Liceu Gil Eanes em São Vicente (anos trinta). Antes de vos apresentar a foto, vejam Hitler a discursar aos jovens de então (reparem na saudação):

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Embora o tom deste discurso me faça lembrar outros discursos mais recentes, abstenho-me de os evocar e vou de imediato mostrar-vos as fotos seguintes, a de um comício do Führer e a da classe de ginástica da minha mãe:
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Não é difícil tirar as conclusões, nesse tempo em que Salazar se exercitava com as ideologias de seu comparsa adolfino. E a ditadura de Salazar e seus seguidores, durou 40 anos! Mas, eis que em 1974, com o 25 de Abril, chega a Liberdade e o anti-fascismo a Portugal e à nossa terra!

Pululavam os comícios e assistia-se aos mais inusitados exageros do lado da revolução. Presenciámos actos de "africanização" dos costumes, com pessoas a deitar vinagre no cabelo (para os tornar crespos), a comer com as mãos, sentadas no chão, enfim, a fazer tudo o que mais lhes pudesse afastar dos hábitos dos derrotados colonizadores. É assim, que surgiram novos nomes próprios nos registos civis cabo-verdianos, como: Abel Djassi, Samora, Lumumba, Kwame, Che, Guevara, Lenin, etc..

Meu tio Oldegar, que tal como o pai (meu avô) era conhecido pelo seu acutilante espírito de contradição, irritado com esses nomes "esquerdistas", resolve dar ao seu então mais recente pimpolho, o pomposo nome de ... Adolfo Hitler de Melo Sousa Brito.

Pobre rapaz! Que culpa tinha ele para carregar este aberrante epíteto pela vida fora. Felizmente, teve o bom-senso de mandar retirar o Hitler de seu nome, logo que fez 18 anos! Parabéns!

Para desanuviar os espíritos, deixo-vos agora com um anti-fascista da época, que se estivesse vivo, completaria hoje 80 anos! Trata-se do autor de "Grandola vila morena!":

ZECA AFONSO
Nascido em Aveiro, a 2 de Agosto de 1929
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