Vou falar-vos da versão mais lógica e menos conhecida da origem da palavra "badiu" , que tem vários significados mas que hoje identifica o habitante da ilha de Santiago de Cabo Verde.
Mas,... quem sou eu para resolver falar de assuntos de linguística, se a minha formação é da área das chamadas ciências exactas?
Mas,... quem sou eu para resolver falar de assuntos de linguística, se a minha formação é da área das chamadas ciências exactas?
Em primeiro lugar, neste blog, os artigos têm sempre o tal cunho pessoal e não devem ser considerados artigos científicos. Em segundo lugar, eu sempre me desenvencilhei bem em matemática (a disciplina em que melhores notas apanhava) o que me estimulava as células cinzentas da região cerebral também responsável pelos dotes linguísticos. É assim que apanhei o gosto pelo estudo da origem das palavras e a nossa língua cabo-verdiana me trouxe e traz um campo fértil e "gostoso" de pesquisa (deveras transdisciplinar) nesse domínio.
A rigor, o "badiu" designa o camponês do interior da ilha de Santiago. Tanto mais que as expressões (antigas) "badiu di fora" (de fora da cidade), "badiu burro" (retratando o carácter campónio do iletrado indivíduo) e "badiu di pé ratchado" (indicando as gretas das ourelas dos descalços pés, próprias do contacto desses mesmos pés, com a lama pedregosa dos campos cultivados) reforçam a natureza campesina do mesmo. Hoje estas expressões não têm cabimento.
A vida difícil acabou por levar o "Badiu" a migrar para outras ilhas (sec. XIX e seguintes) onde os habitantes os identificavam como oriundos da ilha de Santiago, generalizando o termo a todos os habitantes dessa ilha, incluindo os da cidade da Praia. Estes, até aos anos setenta do século XX, sabiam que o termo "badiu" lhes servia para designar os que provinham do interior de Santiago.
A rigor, o "badiu" designa o camponês do interior da ilha de Santiago. Tanto mais que as expressões (antigas) "badiu di fora" (de fora da cidade), "badiu burro" (retratando o carácter campónio do iletrado indivíduo) e "badiu di pé ratchado" (indicando as gretas das ourelas dos descalços pés, próprias do contacto desses mesmos pés, com a lama pedregosa dos campos cultivados) reforçam a natureza campesina do mesmo. Hoje estas expressões não têm cabimento.
A vida difícil acabou por levar o "Badiu" a migrar para outras ilhas (sec. XIX e seguintes) onde os habitantes os identificavam como oriundos da ilha de Santiago, generalizando o termo a todos os habitantes dessa ilha, incluindo os da cidade da Praia. Estes, até aos anos setenta do século XX, sabiam que o termo "badiu" lhes servia para designar os que provinham do interior de Santiago.
Vejamos agora a explicação mais conhecida da origem do termo "badiu" que em língua portuguesa se diz "badio". NB: usarei doravante o termo português badio e sem aspas.
Premissa nº1: muitas palavras do cabo-verdiano com sílabas começadas pela letra b, provieram de palavras do português com sílabas começadas pela letra v : baca, bento, cabalo, balenti, bedjo, nobo, nabadja, nabega, coba, bruga, besgu, etc. O fenómeno linguístico em causa é conhecido por betacismo
Premissa nº2: muitos escravos conseguiam fugir e deambulavam pelas montanhas e vales recônditos de Santiago. Eram chamados de "negros fujões".
Construção da explicação da origem da palavra: Esses negros fujões passavam privações e se organizavam para vir assaltar as casas na cidade e roubar comida. "Lá vêm aqueles vadios, desgraçados, fogo neles!" exclamavam as autoridades portuguesas em face dessas ocorrências. E a palavra vadio foi rapidamente passada pelos cabo-verdianos, para badio.
Esta é a versão conhecida e que, a meu ver, "mete água" por todos os lados:
Assisti a um momento cultural no então Instituto Cabo-verdiano do Livro, nos finais da década de setenta (do século passado). Ali se encontravam alguns intelectuais cabo-verdianos, entre os quais Felix Monteiro. Este, no decorrer de um debate, apresentou a seguinte "tese" sobre uma outra origem do vocábulo badio:
A argumentação era a de que os camponeses (estamos já no século XVIII) que forneciam frescos à cidade, cultivavam-nos nos arrabaldes da mesma ou seja nos terrenos baldios, também designados apenas por baldios.
Frases como: "vamos à praça comprar as hortaliças dos baldios (terrenos)" eram interpretadas pelos demais como "...hortaliças dos Baldios (grupo de pessoas)
Baldio passa a Baldio (com o a mudo), a Badio, e a Badiu
Esta é a versão que mais faz sentido, pois:
Premissa nº1: muitas palavras do cabo-verdiano com sílabas começadas pela letra b, provieram de palavras do português com sílabas começadas pela letra v : baca, bento, cabalo, balenti, bedjo, nobo, nabadja, nabega, coba, bruga, besgu, etc. O fenómeno linguístico em causa é conhecido por betacismo
Premissa nº2: muitos escravos conseguiam fugir e deambulavam pelas montanhas e vales recônditos de Santiago. Eram chamados de "negros fujões".
Construção da explicação da origem da palavra: Esses negros fujões passavam privações e se organizavam para vir assaltar as casas na cidade e roubar comida. "Lá vêm aqueles vadios, desgraçados, fogo neles!" exclamavam as autoridades portuguesas em face dessas ocorrências. E a palavra vadio foi rapidamente passada pelos cabo-verdianos, para badio.
Esta é a versão conhecida e que, a meu ver, "mete água" por todos os lados:
- O betacismo não é tão presente assim, que possa ser generalizado. Há muitos mais casos de conservação do v na passagem do português para o cabo-verdiano, do que à primeira vista parece. Aliás, se vadio desse badio, então porque não diríamos badiachi em vez vadiachi, ou "forti bâdia, nha guenti!" em vez de "forti vâdia, nha guenti!"
- A maioria dos termos em b de que falamos, transitou já com o b do linguarejar dos colonos portugueses de origem nortenha, que diziam (e dizem): binho, bamos, bentania, biola, etc. E não vejo nortenhos dizer "os badios são aqueles que andam a badear por aí"
- Mal vejo os camponeses cabo-verdianos a interiorizar um termo que era depreciativo e até pejorativo.
- Como poderiam vadiar os camponeses, se por o serem nestas ilhas, se tornavam forçosamente sedentários e não nómadas?
- A maior parte dos defensores do badio proveniente de vadio, não são Badios! (infiram vocês o resto)
Assisti a um momento cultural no então Instituto Cabo-verdiano do Livro, nos finais da década de setenta (do século passado). Ali se encontravam alguns intelectuais cabo-verdianos, entre os quais Felix Monteiro. Este, no decorrer de um debate, apresentou a seguinte "tese" sobre uma outra origem do vocábulo badio:
Badio vem de baldio, tendo havido a queda da letra l.
A argumentação era a de que os camponeses (estamos já no século XVIII) que forneciam frescos à cidade, cultivavam-nos nos arrabaldes da mesma ou seja nos terrenos baldios, também designados apenas por baldios.
Frases como: "vamos à praça comprar as hortaliças dos baldios (terrenos)" eram interpretadas pelos demais como "...hortaliças dos Baldios (grupo de pessoas)
A transformação linguística subjacente (supressão de fonemas) é conhecida por Metaplasmo e no caso vertente, onde o som que desaparece está no meio da palavra é uma síncope.
Baldio passa a Baldio (com o a mudo), a Badio, e a Badiu
Esta é a versão que mais faz sentido, pois:
- O significado de camponês de "fora" se coaduna com o do habitante dos baldios.
- A transformação por síncope é mais natural do que a por betacismo
- A conotação não é sentida pelos próprios como desprestigiante (logo facilmente adoptada pelos mesmos).
- Identificar alguém como baldio (dos arrabaldes) é mais evidente (traje e função na sociedade) do que identificá-lo como vadio (negro fujão).
- Os terrenos baldios estavam "na moda" no tempo do Marquês de Pombal e foram ao longo dos anos em Portugal, sempre objecto de política agrária, polémica e referências.
- Os habitantes da cidade da Praia não se consideravam Badios!
O absurdo do Badio porvir de Vadio
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A lógica e o fazer sentido, do Badio porvir de Baldio
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A lógica e o fazer sentido, do Badio porvir de Baldio
Só encontrei uma referência na Internet que fale da origem baldio; mas ela é em língua alemã. Ei-la aqui
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